A consciência da qual tratamos nesse momento, apresenta-se como resultado do acúmulo de informações e conteúdos capazes de sugerir e provocar críticas e questionamentos sobre fatos e acontecimentos que nos rodeiam.
A consciência negra portanto, pode ser entendida como a propriedade que nós, homens e mulheres negros e negras possuímos, de perceber e entender as situações que vivenciamos em nosso dia a dia. É praticamente um estado de estar consciente.
Quando a polícia entra numa rua de nossa periferia, atira na cabeça e mata um jovem negro, é possível entender que o estado julga esse jovem como um ser inferior, portanto irrecuperável e incapaz de interagir socialmente. E essa foi a mesma justificativa utilizada a 500 anos atrás para escravizar e dizimar centenas de milhares de negros e negras no período da escravidão. Quando detemos essas informações e somos capazes de inter-relacioná-las fazendo uma leitura atualizada da conjuntura, podemos afirmar que estamos manifestando a Consciência Negra.
A consciência está presente quando identificamos a ação do preconceito, da discriminação e do racismo em nossas vidas.
Preconceito e racismo
Preconceito é a ideia pré-estabelecida a respeito de algo ou alguém. Somos capazes de fazer um pré-julgamento daquilo que não conhecemos. Quando numa rua deserta nos deparamos com um homem negro e “mal encarado”, a primeira ideia que vem em nossas mentes é de que esse homem possa ser um ladrão, estuprador e etc. Isso é pré-conceito é julgar sem conhecer.
Mas engana-se quem pensa que o pré-conceito seja um elemento que precisa ser combatido. Muito pelo contrário. Essa capacidade de pré-conceber ideias a respeito de algo ou alguém é inerente da capacidade humana, faz parte do nosso legado racional.
O problema do pré-conceito está na plataforma ideológica que ele está alicerçado. O problema do preconceito está no racismo. É o racismo quem sustenta na grande maioria das vezes todos os conceitos a respeito do ser negro e de todas as suas peculiaridades.
Voltando a rua deserta, quando temos o homem negro a nossa frente, automaticamente as informações racistas a que fomos submetidos ao longo de nossas vidas nos fazem imediatamente ver à nossa frente à imagem do mal. O racismo disse durante séculos que nós éramos inferiores, disse que não tínhamos alma. O racismo disse que a religião dos negros cultuava o diabo, que negros jogam capoeira e isso era condenado. O racismo disse que as mulheres negras vendiam o bolinho do diabo chamado acarajé. E é esse mesmo racismo que nos induz a acreditar que aquele homem da rua deserta seja um homem do mal, seja um mau elemento.
Contudo, quando nós conseguimos nos apoderar das informações que nos trazem a verdade a respeito de nós, daquilo que nos pertence e desenvolvemos ferramentas e ações que combatam esses pré-conceitos, nós automaticamente estamos combatendo o racismo e exercendo a consciência negra.
Racismo institucional
Como o próprio nome já diz, o racismo institucional é aquele que se manifesta nas instituições e pode ser considerado um dos mais perversos, porque suas ações atingem sempre no coletivo. O racismo institucional pode ser identificado nas ações dos governos, nas grandes empresas etc.
Observe o estado das ruas em Vilas do Atlântico e compare com ruas do Lotemanto Jardim Metrópole em Itinga. Veja que um esgoto aberto num bairro nobre jamais permanecerá jorrando fezes pro meio da rua durante semanas e as vezes meses.
Veja e perceba que as lâmpadas dos postes em bairro nobre são mais potentes do que as que são instaladas nos potes de bairros pobres e negros. Perceba que a ação da polícia num bairro habitado por brancos é diferente da ação dessa mesma polícia num bairro de negros. Veja como é feita uma busca policial num condomínio de luxo e num barraco em bairro pobre. Essas observações dão conta do que é o racismo institucional. Mas tam mais.
Observe que programas desenvolvidos pelo governo como o PRONASC, que concentra mais de 80% dos recursos na aquisição de armamento bélico pra polícia matar, ao mesmo tempo em que pede que pessoas simples deem oficinas culturais gratuitas nas comunidades. Perceba o quanto o estado tem mais prazer em liberar urnas funerárias do que desenvolver atividades culturais nas periferias. O estado compra e mantem um helicóptero no ar e busca um assaltante negro dentro da periferia, mas é incapaz de oferecer uma assistência real àquela mãe que desesperada tenta tirar seu filho das drogas. Isso é racismo institucional.
Ricardo Andrade
Movimento Negro Unificado
Campanha Reaja
Posse PCE / Mov. Hip Hop