quarta-feira, julho 8

Por que Heraldo nunca foi ofendido e Maju acabou discriminada?


Repórter especial em Brasília, Heraldo Pereira ocupa a bancada do Jornal Nacional na cobertura de folgas e férias do titulares desde 2002. Foi o primeiro jornalista negro na função desde a estreia do telejornal, em 1969.
Ser âncora do JN proporciona uma visibilidade muito maior do que ser ‘moça do tempo’. Então por que Heraldo, em 13 anos, nunca sofreu a mesma ofensiva racista direcionada a Maria Júlia Coutinho, que está na equipe do telejornal há apenas dois meses? Aliás, não foi a primeira vez que a jornalista tornou-se vítima de cyberbullying.
Apresento quatro conclusões pessoais e meramente especulativas:
Sexismo e misoginia – Homem pode chegar no topo da profissão. Mulher? Não, mulher não pode. É inegável que o racismo em relação a Maju está impregnado também de machismo. Na sociedade brasileira do século 21, o sexo feminino ainda é visto por muitos como inferior, menos capacitado, com menor mérito. Maria Júlia ‘ousa’ falar de igual para igual com seu chefe, William Bonner. Já chegou até a corrigi-lo no ar. Essa independência e a força feminina incomodam, ainda mais quando associadas à cor da pele. Estudiosos afirmam que, no Brasil, a mulher negra sofre ainda mais preconceito do que o homem negro.
Negritude explícita – Maria Júlia assume quem é. Usa cabelo black power e dispensa maquiagem que clareia a pele. Ela não tenta disfarçar (inutilmente) sua origem étnica, como muitos o fazem ao chegar à TV. Em mais de uma ocasião, a apresentadora Regina Casé disse que, se a mulher é negra, mas tem o cabelo naturalmente liso ou alisado, é vista e tratada como branca, ou quase isso. Mas se é negra e tem o cabelo ‘pixaim’ (termo usado por ela), aí passa a ter um grande problema para ser aceita. O preconceito estético relatado por Casé tem lógica. Obviamente toda mulher tem o direito de usar o cabelo do jeito que quiser. Maju prefere os cachos crespos que evidenciam sua negritude. Não tenta disfarçar para, talvez, ser melhor aceita.
Alto custo da popularidade – Todo mundo já ouviu falar do tal preço da fama. Não é balela. Cobra-se realmente um pedágio de quem conquista o sucesso. Estar no horário nobre da TV é tornar-se a vidraça para pedradas. O JN já teve dezenas de ‘moças do tempo’. Porém nenhuma conseguiu o mesmo destaque de Maju. O carisma a transformou, num período de poucos dias, em queridinha da Globo e do público. Esse status incomoda quem não tolera a ascensão alheia. Heraldo Pereira sempre teve uma performance discreta no Jornal Nacional. Restringe-se aos textos gerados no teleprompter. Já Maju é a expansividade em pessoa. Improvisa, ironiza, ri, domina a cena. Virou celebridade, tem fãs. Isso é ultrajante para quem se incomoda com a presença de mulheres e/ou negros numa posição de destaque.
Puro recalque – A melhor resposta para os ataques racistas partiu da própria Maria Júlia Coutinho. Numa rede social, ela mandou ‘beijinho no ombro’ a quem a ofendeu. Cito aqui uma frase do midiático pintor espanhol Salvador Dalí (1904-1989): “O termômetro do sucesso é a inveja dos descontentes”.
Fonte: Terra

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seja breve e responsável. Não toleraremos ofensas nem agressões a terceiros.