segunda-feira, março 16

Politizando nossa morte



Politizando nossa Morte
Ato Político em Memória de Clodoaldo Souza e outr@s irmã(o)s vitimas da Politica Criminal do Estado


No dia 1º de março de 2007, Cleber Álvaro (21 anos), Clodoaldo Souza (21 anos), ao caminhar pela rua principal do bairro onde moravam, foram abordados por uma viatura da policia militar. Como era de rotina, obedeceram aos comandos da revista, sendo logo em seguida liberados. Meia hora depois, quando retornavam para casa pela da Estrada Velha do Aeroporto foram abordados por dois carros, com cerca de oito homens fortemente armados. Cleber e Clodoaldo, sem esboçar qualquer tipo de resistência, obedeceram acreditando de que se tratava de mais um dos baculejos da policia. Sem conceber nenhuma possibilidade de reação, os ocupantes deste carro, municiados de armas de diversos calibres, deflagraram vários disparos contra os jovens.

Clodoaldo Souza, lembrado hoje por nós, como Mc Blul, mesmo demonstrando sinais de que estaria rendido, foi sumariamente assassinado. Outro jovem, de identidade não revelada, foi atingido por um projétil na perna, mas conseguiu adentrar a mata que margeia a estrada e ganhar fuga. Cleber Álvaro, conhecido popularmente como MC Bronca, foi atingido três vezes ­– um projétil alojou-se em sua coluna, um em sua virilha e o outro atravessou a sua coxa.

Antes mesmo de qualquer investigação mais aprofundada, autoridades policiais informaram a alguns jornalistas que o crime correspondia a mais uma das rotineiros episódios que caracterizam a disputa por território entre traficantes de quadrilhas rivais. Para os meios de rapinagem jornalística, Blul e Bronka seria mais alguns jovens negros que poderiam ser facilmente etiquetados como criminosos e ter seus cadáveres expostos a contemplação massiva. No entanto, Blul e Bronka além de serem mais alguns jovens negros de periferia sem antecedentes criminais, eram artistas amplamente conhecidos pelo Movimento Hip Hop de Salvador.

Blul fazia rap e era militante do grupo Etnia e Bronka uma das principais vozes da banca MPS (Malokeir@s Para Sempre). Ambos demonstravam amplo conhecimento da dinâmica que orienta a criminalização de jovens negros de periferia e se colocavam em consonância com a Campanha “Reaja ou será Mort@!” Ainda no enterro de Blul, nos mobilizamos no sentido de rebater a versão da grande mídia e exigir das autoridades competentes reparação para a família destes jovens já que, pelo que tudo indica, a morte de Clodoaldo e a deficiência irreversível de Cleber foram decretadas por um grupo paramilitar de extermínio que atua nas cercanias da Estrada Velha do Aeroporto e que este grupo conta com presença de policiais.

Nossos esforços não foram apenas em enfrentamento aos que apertaram o gatilho que matou Blul, mas contra toda política de segurança que banaliza o extermínio de milhares de irmã(o)s. Nós organizações de movimento social, empenhadas na defesa de direitos de nossas comunidades, entendemos que o episódio que interrompeu de modo trágico a juventude de Blul e Bronka em sua fase mais produtiva não pode ser entendido como um caso isolado. Além do caráter seletivo das penas judiciais – que evidenciam um aparato normativo extremamente racista - podemos flagrar na dinâmica histórica da vida social brasileira, uma seletividade sócio-racial no que toca a aplicação de penas extra-judiciais, aplicadas sobretudo, por agentes policiais e/ou parapoliciais de extermínio.

Cleber permanece até hoje com duas das balas alojadas em seu corpo e sem nenhum tipo de reparação ou amparo legal oferecido pelo Estado. Não tivemos conhecimento sobre os resultados do inquérito que investigou a morte de Blul nem tampouco houve mudanças significativas da política de segurança. Esperamos que os ventos que sopram nesta quarta feira nos inspire a lutar por Justiça.

A memória de Blul representa a de tod@s aqueles que tiveram a sua vida interrompida meio à guerra que estamos enfrentando. Por isso conclamamos às nossas comunidades para acender velas e levar flores em memória de todos os jovens negr@s mort@s nestas circunstancias.

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