segunda-feira, junho 15

Sobre a politica de descriminalização das drogas, o Mainstream e o atual modelo de segurança pública.





Por Marcos Rezende


Nas últimas décadas o aparato de segurança pública do Estado tem funcionado na lógica de seguir os caminhos mais simples e sistematicamente traçados pela política estabelecida pelos Estados Unidos e, quando sinergicamente alinhadas com as mídias tradicionais, criam ambiente favorável na sociedade brasileira para propagar informações convenientes adotando a posteriori as suas convicções políticas como absolutas verdades mundiais.

Quem não lembra dos filmes holiwodianos das décadas de 80 e 90 do século passado que mostravam as gangues de Nova York em bairros negros tomados pelo tráfico, a exemplo do Queens ou do Harlem? Seguido a isso as "soluções" encontradas através da política de Tolerância Zero implementadas pelo prefeito Rudolph Giuliani que era baseada em melhorar a qualidade de vida reduzindo a marginalidade, vindo a adotar medidas extremas que iam de prisão para delitos diversos e "limpeza dos inconvenientes" mendigos das ruas e metrô da cidade. 

Cabe salientar que os Estados Unidos, país que melhor representa o capitalismo na atualidade sendo inclusive a maior potência mundial e mantenedor quemainstream possui também o título da maior população carcerária do planeta com aproximadamente 2 milhões e 300 mil presos no ano de 2014, segundo informações do Centro Internacional de Estudos Prisionais, do King's College, de Londres. 

A adoção da política de combate ao inimigo interno, a ocupação das comunidades periféricas através do cerceamento de garantias constitucionais de liberdade de ir e vir, a estratégia de isolar bairros inteiros são "justificáveis" através da argumentação do combate ao crime e as drogas, transformando esses dois últimos nos responsáveis pelo crescimento da violência e até mesmo aproveitando a insegurança social para inserir no centro dos debates a redução da maioridade penal ao tempo em que trata os espaços públicos ocupados por drogaditos (usuários) como casos de segurança pública, ao invés de saúde. 

Os efeitos dessa devastadora política equivocada tem custado milhares de vidas dos dois lados, sendo a maioria de jovens negros. Quando não mortos, sofrem o encarceramento ou ficam sequelados para o resto da vida, isso é claro, para além da estigmatização, do custo ideológico e também financeiro ao estado e contribuintes.

Em tempo, movimentos sociais, entidades da sociedade civil, intelectuais e diversas associações e ordens buscam alternativas para debater o tema, no entanto são impactados por reações conservadoras das velhas elites, de grupos fundamentalistas, da mídia tradicional e políticos de centro-direita.

Nesse contexto dois elementos centrais são nitidamente perceptíveis: a falta de eficácia da política vigente que se desmonta ante a sensação de estar "enxugando gelo" expressão essa bastante utilizada por policiais e a necessidade de uma ampla mobilização social para impulsionar um grande e profundo debate sobre um novo rumo de modelo de segurança pública aliado aos princípios e garantias de direitos humanos para reconstruir o tecido social e reaproximar as maiores vítimas dessa tragédia que são os jovens negros e representantes do aparato de segurança pública do estado, também composto em sua maioria por pessoas negras e periféricas, ou seja, ambos vítimas do sistema capitalista. 

Tanto os que representam a lei quanto os que cometem o legalmente caracterizado como ilícito são vistos como "peças baratas de reposição" seja no que tange ao grande e lucrativo negócio do tráfico como para a mão de obra da polícia.

Afinada a este sentimento e se antecipando às outras instituições integrantes do sistema de justiça, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro promoveu um grande debate e, convencida da atual ineficiência dessa política de combate as drogas,  enviou uma recomendação a todos os defensores públicos do estado do Rio para que peçam automaticamente a revogação de toda prisão de usuários de drogas, independentemente de classe social. A recomendação acontece pouco antes de o Supremo Tribunal Federal decidir sobre a inconstitucionalidade do polêmico artigo 28 da Lei Antidrogas, que criminaliza o porte e o consumo das substâncias consideradas ilícitas.

O artigo 28  da Lei Antidrogas que tipifica como ilícita a conduta de portar drogas é uma afronta aos princípios da dignidade da pessoa humana, da sua intimidade e da vida privada. Em suma, expor o sujeito de direitos a sanção criminal devido a valores sociais e/ou morais tidos por majoritários é própria de sociedades totalitárias. O que significa um homem livre de impurezas senão a imputação de critérios subjetivos e identificados com a moral dominante? Não é admissível sob a vigência do Estado de Direito, em sociedade democrática como é a brasileira a utilização de tais critérios para o encarceramento, aliado ainda a imputação tendenciosa "do agravante" relacionado ao preconceito racial, a condição sociocultural e econômica ao imputar os "merecedores" de pagar por tal crime.

As instituições públicas sejam do sistema de justiça, dos demais poderes  formalmente constituídos, as igrejas e demais entes da sociedade civil, não podem ser instituições engessadas, anacrônicas e ancoradas em antigos paradigmas, que reproduzem o Mainstream ou que se alimente das luzes fractais dos fogos de artifício ou jogar para a torcida.

Se as drogas saírem da ilegalidade, seu mercado se equipararia a uma atividade econômica qualquer, submetida a impostos convertidos no próprio sistema de saúde. Além de extinguir   a clandestinidade e remodelar todo o sistema de segurança pública vigente e salvar vidas. Muitas vidas.

A pós contemporaneidade cobra de nós antecipação e coragem para assumir posturas vanguardista frente aos grandes embates que se descortinam. Cabe a nós ousarmos.

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